Você não precisa abraçar o mundo!


Acabei de desligar a tevê da sala. Tava passando o romance que a gente ficou de ver no ano passado, mas você não pode porque precisou viajar. Disse que tentaríamos na semana seguinte, mas já não estava em cartaz quando você voltou. Procurei outras opções na grade de programação, repeti o convite duas vezes até que sumiu aos poucos.
Lembrei disso por conta do trailer. Parecia triste, você disse. Mas era bonito, viu, bonito pra caramba. Quase consegui olhar para trás e pegar aqueles dias nas palmas das mãos. Estiquei bastante o braço, chegou a doer no canto dos ombros pelo tanto de força que eu fiz para ver se conseguia puxar para perto, mas só enxerguei o sorriso que você dava quando a gente saía para tomar alguma coisa num café barato.
Chega a ser estranho como as coisas funcionam dentro do peito nessas horas. Eu poderia jurar que seria a gente ali, mesmo que não filmassem nossas vidas. Conseguia fechar os olhos e encontrar a tua cabeça no meu ombro no escuro da sessão das três. Precisei de lenço, precisei de afago, precisei pausar o filme umas quatro vezes para me localizar na história outra vez.
Demorei um tempo para assimilar as coisas. Demorei uns minutos a mais para tirar da cabeça a pergunta que ficava martelando, quase entrando em transe para saber se você havia lembrado de mim quando assistiu. Se é que assistiu. Se é que lembra da história que havíamos combinado de ser nossa naquele dia.
Dói um pouco. Faz a cabeça voltar no tempo e dar nó. Onde foi que você se enfiou que não aqui? Tanto faz, também. Talvez se o mundo virasse do avesso e você parasse na frente da porta de casa antes de eu trancar as janelas e deitar para dormir, as coisas não voltariam a ser como eram. Eu não sou o mesmo, de qualquer forma. A gente nunca é.
De repente não era para ter sido e o filme só acordou uma série de sentimentos que estavam adormecidos aqui dentro. Vai ver faltou um pouco de luta da minha parte quando você disse que não daria mais. Mas eu tentei, juro que tentei. A gente nunca sabe até onde as pernas vão aguentar.
Pensei em correr, pensei em botar a porcaria do pé na estrada antes que o tempo passasse demais, quase bati na porta da tua casa numa terça-feira de carnaval. Madrugada do lado de fora e eu aqui dentro. Sempre esperando alguma coisa acontecer.

Unknown